sábado, 1 de novembro de 2008

Um Quid Pro Quo

Muito se ouviu falar de panaceia, a propósito da crise financeira que se vive. Pois hoje descobri, numa pecinha engraçada, a resposta hábil ao desejo de recalcitrantes enformados em pacientes de curar moralmente o Homem, por uma poção, em vez de se intentar tal pelo Esforço. Partindo do princípio do Boticário, um de nome André que traz ressonâncias do Mestre da loja da canção, faz o experiente farmacêutico oferecer-se para tudo sarar, até os males que temos mais habituais do que nunca:
Os entorses da política
Das Leis e Contribuições...
Doenças dos corações
E qualquer mal refractário,
Tudo cura o boticário
Com as Suas infusões!

Aqui se aviam sentenças,
Se curam máguas e tédios,
E a quem morra dos remédios
Não se pedem recompensas.
Venham todos sem detenças
Que a botica tem virtude.
E que Deus lhes dê saúde
P´ra terem muitas doenças.

O resto é o esquema de um cliente simbolizando o padecimento de cada um dos Sete Pecados Capitais, com diálogo em versos de maior agilidade espiritual do que, muitas vezes, a pregação dos bons princípios revela. Acabando por receitar à Inveja três gotas de Caridade e um poucochinho de Amor; à Gula, a par do bicarbonato, a Temperança, à Ira, Água de Paciência; à Soberba, duas fricções de Humildade; à Luxúria, Emplastro de Castidade, à Preguiça, o meu vício preferido, uma prática de endireita de Diligência; e à Avareza, sangrias com Liberalidade.

O meu exemplar calha a ser único, porque dedicado pelos Autores a Alguém que foi grande na difusão da Cultura em Portugal, nos tempos em que a concepção dela não se cingia aos concursos e telenovelas ue embrutecem. E que massificam, como as prescrições que se tenta fazer consumir uniformemente pela Massa, em vez de tratar cada qual com o que especificamente lhe convém.

8 comentários:

cristina ribeiro disse...

Pronto,aposto que o boticário se vai cansar de passar receitas de três gotas de caridade e um poucochinho de amor, porque eu pecadora me confesso do mal de inveja: esse livrinho despertou-o em mim :)
Beijo, Paulo

Anónimo disse...

Pois é, meu caro Paulo, andam todos preocupados em acertar com a receita ideal e esqueceram-se que reflectir e pensar em novas soluções é essencial para o progresso. Se julgam que isto vai lá com mezinhas estão muito enganados, estes boticários da treta da governança.
Grande abraço

Marie Tourvel disse...

Então és preguiçoso também? :)
Beijo

Paulo Cunha Porto disse...

Querida Cristina,
realmente, não o vejo muito. Mas com esta dedicatória então...

Meu Caro Carlos,
gerou-se uma cultira do instantâneo que pouco valoriza a preparação suada dos resultados. É o ideal de pílulas para tudo, que põe o País... pílulas!

Querida Marie Tourvel,
aqui confesso a minha causa de condenação ao Inferno:
http://calmapenada.blogspot.com/search?q=pregui%C3%A7a

Beijinhos e abraço

Marie Tourvel disse...

Bem, entrando no linque descobri que és de escorpião, portanto, aniversário por aí... ou já foi e estou atrasada? ;)
Belo post sobre a preguiça.
Adoro seus posts. A cada dia descubro um.
Um beijo e um abraço do... Diabo? :)))

Paulo Cunha Porto disse...

Não, Querida Marie, sou escorpião puro, muito perigoso pelo veneno, portanto. Quando chegar o dia darei notícia da duvidosa efeméride.
Beijinho

Anónimo disse...

Ah, obrigada, Paulo! Tem graça lembrar-se de evocar o Teatro Novo - ainda que através de uma dedicatória - um teatro de câmara tão especial como esse foi, que se estreou com uma peça do Pirandello! Um dia explico-lhe por que razão esse comentário se revelou tão oportuno neste momento da minha vida. Abraço reconhecido, RF

Paulo Cunha Porto disse...

Querida RF,
fico contentíssimo por, ao que me conta, ter eu acertado mais do que esperava! E gosto muito de Pirandello.
Beijinho