quinta-feira, 20 de novembro de 2008

O Bloguista Técnico

Imaginem só, como a desvergonha não tem limites, hoje vou abalançar-me a escrever sobre Economia! Ou melhor, sobre a auxiliar dela que é a língua. Há muito que desconfiava, mas esta dúvida do Prof. César das Neves fortaleceu-me a convicção de que na degradação do termo técnico tudo está ligado. Ainda admitia que a Recessão Técnica fosse uma categoria amplamente constatada e teorizada pelos Académicos. Um dos mais Ilustres vem agora desenganar-nos, dizendo que ela surgiu dos títulos da Imprensa, o degrau imediatamente acima do Nada.
Ora, o que vos proponho é o percurso de perda do estatuto técnico. Talvez tenha começado com a consagração profissional Engenheiro Técnico, considerado um grau de habilitação não tão dilatada com o Engenheiro tout court. Mas para o inconsciente colectivo não chegava, por estar associado a actividades profissionais estimáveis. Veio então o Futebol, começou-se a dizer de uma equipa que não conseguia grandes resultados, apesar de possuir jogadores com dotes, que tinha muita técnica, mas... pouco ou nenhum rigor. Isto sim, já começava a entrar na cachimónia da gente. E eis que surgiu a gota de água, o Inglês Técnico com que o Sr. Sócrates terá, por correspondência, acabado o curso. À primeira vista pareceria um segmento linguístico que não é dominado por todos. Mas tanta conversa sobre a insuficiência de certificações para a assunção de uma categoria profissional, outra coisa não fez do que inculcar a ideia de que se tratava dum pedaço do idioma mais rasca, "não tão inglês como o resto".
Que admira pois, com a criatividade dos Gentlemen of the Press, que se denomine assim uma recessão que não (se sabe se) é tão recessão como a "pura", resultante da avaliação de um ano? Para mais, sendo a que não precisa de ser caucionada pela análise de reputados professores de Economia.

9 comentários:

marilia disse...

Técnico é uma palavra triste.
Meu emprego de "técnico-administrativo" que o diga...
Uma função que não tem função. Serve pra nada e pra tudo ao mesmo tempo: ao gosto do fregês. Ou do chefe.

marilia disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Já era palavra de má nota aplicada em vez de treinador. O técnico do clube tal era sempre referida aos clubes mais pequenos.

Anónimo disse...

Excelente! Escreva sobre Economia à vontade, Meu Caro. Pois se até os economistas o fazem e com a agravante de não acertarem uma...

Abraço.

Gi disse...

Ai, Paulo, que eu hoje de manhã quando li o Professor, pensei mais ou menos o mesmo, mas não tão elaboradamente.

Mike disse...

Ainda bem, devo confessar, que venci o primeiro impulso em evitar continuar a ler-Te depois da primeira linha. E devo acrescentar que as crises, quem as define é o povo, não os economistas e os técnicos.
Abraço.

Luísa A. disse...

Meu caro Paulo, depois de ler, com muito gosto, esta sua deliciosa análise sobre a evolução «estatutária» do termo «técnico», só tenho a acrescentar que de bloguista «técnico», não tem nada… a não ser que tenha decidido meter ombros à tarefa (já, provavelmente, um pouco árdua) de recuperação da palavra. ;-)

Bic Laranja disse...

Boa! Relembro só que a coisa já andava impressa no Expresso no tempo do primeiro consulado de Cavaco: os seus ministros eram, não políticos, mas tecnocratas. Não é de agora que a democracia tem pendor técnico.
Cumpts.

Paulo Cunha Porto disse...

Querida Marília,
o meu primeiro emprego era equiparado a "técnico superior de 2ª classe". Claro que sempre achei incompatibilidade entre os termos qualificativos. Mas hoje vejo que ambos convergiam numa promoção do substantivo...

Meu Caro Rudolfo,
dava ideia de ser o que consertava qualquer coisa avariada, não era?

Meu Caro Mialgia,
ehehehehe! São os astrólogos do nosso tempo, sem dúvida. Mas com um campo de previsão menos sério, embora de consequências por norma mais funestas. Obrigado.

Querida Gi,
Quando temos a corroboração de um Belo Espírito é sinal seguro de irmos por caminho certo...

Meu Cro Mike,
Ah! Pois é, Quem é que fica com as cicatrizes no lombo?

Querida Luísa,
não me sinto com forças para tal, era mesmo constatação de limitações. Mas agradeço à Minha Querida amiga considerar a minha auto-adjectivação tão imprecisa como a de outras recessões...

Meu Caro Bic,
Fabulosa lembrança!
Perguunto-me é se haverá, com partidos, "democracia" que o não sja.
Beijinhos e abraços