Dia do aniversário de Francis Bacon, pintor de que me incomodam os pressupotos da obra, apesar de reconhecer a sua força expressiva. Dos vários quadros que produziu, subordinados à temática especular, saliento este, Pessoa Escrevendo Reflectida Num Espelho, porque me parece contrariar uma velha ideia feita, a de que a obra passada ao papel espelha o Autor. Pelo contrário, quem escreve é que é um espelho do que aborda, por deformante que possa ser. Nenhum objecto reflector, aliás, nos devolve imagem que não saibamos invertida. É um reconhecimento da realidade, mesmo que alterada por esperado aprisionamento alheio, que nos faz mirar o nosso reflexo. O mesmo engodo que nos leva a procurar num texto o reconhecível, mesmo que com os lados trocados. Nesse sentido espelharemos, por nossa vez, uma imagem do criador de cada escrito, na atmosfera de casa de espelhos numa qualquer feira, em que o ente originário dos milhentos duplos se torna difícil de encontrar. E também acontece outro desvio, o de nos debruçarmos exclusivamente sobre o redigido, sem considerarmos o Autor, coisa de que não se compadece uma linha acabada, tornada ilegível por qualquer superfície que a devolvesse. Salvo em casos-limite como os das urgências que fazem recorrer a ambulâncias com os dizeres pintados de trás para a frente...
terça-feira, 28 de outubro de 2008
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14 comentários:
Muito bem, Paulo! Inteiramente de acordo, até na referência a Bacon, que sempre me provocou repulsa.
P.S: Ai essas bicadinhas futebolísticas. Para quem anda sempre na baixa-mar é chato se o Amigo se afoga com a água pelos joelhos...
Abraço.
"... quem escreve é que é um espelho do que aborda, por deformante que possa ser"... gostei de Te ler, caro Paulo. Ah, e estamos de acordo em relação ao Bacon, que não colhe a minha simpatia.
Abraço.
concordo plenamente...
Paulo, queridíssmo, estou aqui.
Vim em desabalada carreira virtual, porque estou falando com a mais perigosa sedutora da internet, e creio que o meu querido Amigo está a correr riscos.
Pelo nome, o queridíssimo Paulo já tira uma conclusão, veja se pode: MARIE TOURVEL!!!!
Estou aqui para evitar que você sucumba (uiii!) à tentação. Olhe o exemplo de Santo Antão.
Sei que isso foi por causa da menina Júlia - que tem um blog belíssimo - e também por causa de nossa encantadora de borboletas, que é a Aníssima Vidal.
Não repare,estou com febre,alta, e um deliriozinho sempre é permitido. E não impede de se dizer a verdade.;-)))
Distribua um beijo para todos os nossos queridos.
E mantenha distância.
Aliás, eu é que queria levar o Paulo até a Marie, com toda a segurança...mas fui lenta demais, pois como vc mesmo reconhece sou uma vítima das adversidades da vida. Sou a Presidente do Duro das Lamentações.
Querido, um beijinho e obrigada por todo o seu carinho, mas...Cave canem.
Desmaiando, por escrever tanto, retiro-me confiando no seu bom-senso.
Beijos meus e de Marie que está no Skype comigo... rindo a cântaros.
Meg
Uma belíssima reflexão, para um quadro que aprecio.
Parabéns, gostei muito :-)
Bj
Aprecio.
Enquanto "rotulado" de pintor figurativo aprecio e muito.
E depois, não posso deixar de notar uma certa ironia "espelhada" na data de nascimento e morte de Bacon. Reparou?
Dia bom Querido Amigo *
Meu Caro Mialgia,
ia contra-comentar a alusão boleira com um "boa malha!", mas temi agravar o meu caso...
Bacon sempre me incomodou, embora ache interessante a sua atracção artística pelos espelhos. Que no caso da elaboração do que se leia, me parece um bom Mcguffin para matutar um pouco sobre a relação entre Autor e Leitor.
Meu Caro Mike,
é que a mais-valia (termo da moda que julgo já ter conhecido melhores dias) de uma leitura está justamente na porção alterada e na sedução particular que encerre. Quem queira fruir o original que fez de modelo dificilmente procurará a consagração dele num suporte artístico.
Pelo que conheço da Escrita da Júlia, confiava em que talvez não discordasse, sim.
Olha a Mais Deliciosa Voz do Além Blogosférico!
Pois, eu não sou santo, Querida Meg, senão um grande pecador. Logo, só me posso dar bem com o Diabo Encantatório que refere...
E que, aliás, já conhecia e admirava das caixas de comentários do «Sub Rosa»!
Além de muitas outras alegrias esperadas, já Lhe devo o regresso da minha Meguinha. Que se pode querer mais?
Melhoras, Amiguita
Querida Fugi,
obrigado, o quadro tem várias pontas desatadas em que valeria a pena pegar. Outra seria o desinteresse de si provocado pela devoção à escrita, com toda a infirmação que a Experiência nos possa trazer...
Querida Once,
sempre me deixou algo desconfortável a torção das figuras e um certo chamamento do público por um pormenor jocoso mais duro do que a ligeireza dos Surrealistas da Velha Escola...
28-28, não é? Pena o mês não coincidir. Há uma crendice antiga sobre os que nascem e morrem em igual dia do ano. Ainda escreverei um postal sobre isso.
Beijinhos e abraços
escreva sim Meu Amigo .. tenho, infelizmente, alguns casos na família ..
Quanto ao expoenciar o jocoso, encaro-o, na maioria dos trabalhos que lhe conheço, quase que como uma protecção acredita?
..dificil de explicar como se "eu apontar primeiro, ninguém apontará com igual gravidade".
Enfim .. interpretações :)
Querida Once,
o Meu Próprio Pai esteve quase, teve a trombose no dia em que fazia anos, embora só tenha falecido quatro dias mais tarde.
Quanto ao jocoso, não excluo a interpretação que faz. Mas a minha percepção tendia mais para uma exploração enturmante do "troçado comum" com o que ridiculariza a colher os dividendos dos que gostariam de tê-lo feito, mas se contentam em corresponder com a garalhada bruta.
Beijinho
O autor do livro, somos nós os leitores que o criamos.
Paulo, Paulo, querido, a Meg diz que sou isso, mas é só por causa de meu nome. Você já leu meu blogue e sabe bem que não passo de uma palhacinha. :)))
Falando sério, a Meg é uma querida e graças a ela estou conhecendo umas pessoas tão bacanas como você, a Júlia e a Ana.
Um beijinho e até mais.
Querida Patti,
concordo em que a componente de recriação própria da Leitura é importantíssima, mas só desde que não se caia no exagero de declarar irrelevante a assinatura e até ao aparato que são o Autor e história da construção do Escrito.
Querida Marie Tourvel,
se Palhacinha, uma tão Deliciosa que quadra perfeitamente no conceito de Tentação...
Três vivas à Meguita, não só por Ela, como por nos ter trazido esta Espantosa bloguista!
Olha, a nossa Meggodess voltou!
Ainda bem, já fazia falta... vou lá espreitar.
Até já, Paulo.
Também não tardo Lá.
Beijinho
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